
Abdul Kader, 21 anos, estava entre as milhares de pessoas que se deslocavam até o centro de ajuda humanitária na região de Al Alam, a noroeste de Rafah, no sul da Faixa de Gaza. "Meu filho me contou que, a cerca de 500m da entrada do centro, tanques israelenses dispararam diretamente contra a multidão, sem qualquer aviso. Ele viu várias pessoas serem mortas e fugiu de lá", relatou ao Correio o jornalista palestino Motasem Dalloul.
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"Kader me disse que o povo, faminto, se aproximou dos tanques, antes de abrirem fogo. Como ambulâncias e outros carros não tiveram permissão para se aproximar da área, as pessoas carregaram os feridos da maneira que podiam até o Hospital Nasser", acrescentou. Na mensagem de áudio enviada por Dalloul pelo WhatsApp, era possível escutar o barulho de drones e uma explosão. Foi o segundo massacre em 72 horas. Ao menos 27 palestinos morreram e 157 ficaram feridos no incidente. No domingo (1º/6), uma tragédia similar no mesmo local matou 31 e feriu 176.
O Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) confirmou o incidente, as Forças de Defesa de Israel (IDF) reconheceram os disparos e o sistema ONU condenou as mortes de forma enfática. "Ataques mortais contra civis desesperados que tentavam ar a irrisória ajuda alimentar em Gaza são inconcebíveis. Pelo terceiro dia consecutivo, pessoas foram mortas perto de um local de distribuição de ajuda istrado pela 'Fundação Humanitária de Gaza'. (...) É necessária uma investigação rápida e imparcial sobre cada um desses ataques, e os responsáveis devem ser responsabilizados. Ataques direcionados a civis constituem uma grave violação do direito internacional e um crime de guerra", afirmou, em nota, Volker Turk, alto comissário da ONU para os Direitos Humanos.
"Escolha sombria"
De acordo com ele, os palestinos têm sido confrontados com a mais sombria das escolhas: morrer de fome ou correr o risco de serem mortos ao tentarem ar a escassa comida disponibilizada pelo mecanismo militarizado de assistência humanitária de Israel. "A ameaça da fome, junto a 20 meses de matança de civis, destruição em grande escala, repetidos deslocamentos forçados (...) também constituem elementos dos crimes mais graves segundo o direito internacional", advertiu Turk.
Porta-voz do Escritório da ONU para Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA), Jens Laerke disse ao Correio que "equipes médicas confirmaram a morte de mais de duas dúzias de pessoas, após incidente em que palestinos que buscavam comida em novos locais militarizados foram alvejados".
O secretário-geral da ONU, António Guterres, classificou o massacre como "inaceitável". "Civis estão arriscado — e em muitas ocasiões perdendo — suas vidas para ter comida. Ele reforçou o pedido por uma "investigação imediata e independente". "As necessidades básicas da população de Gaza são enormes e não estão sendo atendidas. Israel tem obrigações claras, sob o direito internacional humanitário, de concordar e facilitar a ajuda humanitária a todos os civis que dela necessitem", destacou. Segundo o CICV, o hospital de campanha que a entidade mantém em Rafah "recebeu um fluxo massivo de 184 pacientes; 19 deles foram declarados mortos ao chegarem e outros oito sucumbiram aos seus ferimentos pouco depois".
Em comunicado, as Forças de Defesa de Israel (IDF) informaram que, "durante o movimento da multidão ao longo das rotas designadas em direção ao local de distribuição de ajuda — a aproximadamente meio quilômetro do local —, tropas identificaram vários suspeitos se movendo em sua direção".
A nota acrescenta que os soldados fizeram disparos de advertência contra os "suspeitos", que teriam se desviado da rota determinada pelo Exército. "Depois que eles falharam em recuar, tiros adicionais foram disparados perto dos suspeitos, que avançaram em direção às tropas. As IDF estão cientes dos relatos de vítimas e os detalhes do incidente estão sendo investigados", acrescenta o comunicado.
EU ACHO...
"Pessoas famintas jamais deveriam ser forçadas a arriscar suas vidas para comer. Por quanto tempo mais a comunidade internacional permitirá que essa situação atroz continue"
Jens Laerke, porta-voz do Escritório da ONU para Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA)
Ucrânia explode partes de ponte na Crimeia
Dois dias depois de uma operação sem precedentes que usou drones para destruir 41 bombardeiros russos em bases na Sibéria, a 4 mil quilômetros da fronteira, a Ucrânia utilizou explosivos submersos para danificar a Ponte Kerch, que liga a Rússia à Península da Crimeia, anexada em 2014. O Serviço de Segurança Ucraniano (SBU) reivindicou a autoria do ataque e divulgou a imagem de uma explosão próxima a um pilar. De acordo com o SBU, os es da ponte foram "explodidos" com 1.100kg de trinitroglicerina, o que "danificou severamente" o nível inferior dos es.
Olexiy Haran — especialista em política comparada da Universidade de Kyiv-Mohyla — disse ao Correio que a operação, cujo planejamento durou meses, mostra a capacidade da Ucrânia de atacar não apenas na superfície do Mar Negro, com drones navais, mas também em ações submarinas. "É uma mensagem simbólica importante, principalmente no contexto das ofensivas anteriores, como a operação que destruiu bombardeiros russos. Trata-se de uma guerra simétrica. Os eventos mostram que a Ucrânia pode provocar danos consideráveis à Rússia."
Diretor da Rede de Pesquisa Geopolítica, em Kiev, o estrategista militar Mykhailo Samus lembrou à reportagem que não é a primeira vez que a Ponte Kerch é alvejada. "Esse desdobramento é algo absolutamente natural. A Ponte Kerch é ilegal, por causa da ocupação e da anexação da Crimeia pela Rússia. Por isso, a posição oficial da Ucrânia defende a destruição da estrutura." (RC)