Visão do Correio

Governo caiu numa armadilha fiscal

O deficit fiscal que poderia ter sido zerado na largada do mandato assombra o Palácio do Planalto e gera um clima de incerteza econômica

Eixo Capital 2105 -  (crédito: Caio Gomez)
Eixo Capital 2105 - (crédito: Caio Gomez)

O futuro dirá se o presidente Luiz Inácio Lula da Silva cometeu um acerto ou um erro político, antes mesmo de tomar posse, ao negociar o fim do chamado Teto de Gastos e a aprovação do novo arcabouço fiscal com o Congresso. Isso evitou um duro ajuste fiscal no começo de seu terceiro mandato, mas também anulou a narrativa de que herdou uma bagunça financeira de Jair Bolsonaro. A tentativa de golpe de Estado no 8 de Janeiro marcou o antes e depois do ponto de vista da questão democrática, porém o rombo nas contas públicas foi varrido para debaixo do tapete do Orçamento da União. 

Essa fuga para a frente, agora, está cobrando o seu preço, porque o deficit fiscal que poderia ter sido zerado na largada do mandato assombra o Palácio do Planalto e gera um clima de incerteza econômica — a não ser que se faça, realmente, um ajuste que equilibre as contas públicas sem aumento da carga tributária. A política de expansão de gastos públicos e aumento do consumo popular, por causa do deficit fiscal, não vem surtindo efeito do ponto de vista da popularidade do governo em razão da inflação e dos juros altos necessários para combatê-la.

O governo considera aumentar o IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) para compensar perdas de arrecadação e cumprir a meta fiscal de deficit zero proposta pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Mas isso impõe custo político alto, especialmente em ano pré-eleitoral. Uma receita compatível com o gasto é fundamental para a credibilidade do arcabouço fiscal. Não atingir metas fiscais consistentes provoca reação negativa do mercado, mais pressão sobre os juros e prejuízos à credibilidade do ministro da Fazenda.

Existe uma grande diferença entre governabilidade e governança. A primeira está diretamente associada ao apoio que o governo recebe do Congresso; a segunda, à qualidade da gestão istrativa e financeira. O ajuste depende mais da governança do que da governabilidade. Bloco de forças hegemônico no Congresso, o Centrão dificilmente aprovará um novo aumento de tributos. Os aliados do governo são tão pragmáticos na hora de apoiar o aumento dos gastos públicos, como no caso das emendas parlamentares, quanto ao se opor à aprovação de tributos impopulares, como é o caso do IOF. Ou seja, politicamente, a conta não fecha.

A imagem do presidente Lula está ancorada na defesa dos mais pobres. Como aumentar o IOF afeta crédito, câmbio e operações do dia a dia, essa base de apoio popular sofre um grande estresse. Se o aumento do IOF não é uma bandeira eleitoral do governo, serve para isso, porém, nas mãos da oposição. 

Lula, ou outro candidato do PT, disputará a Presidência em 2026 contra uma direita forte no Congresso, reagrupada nas redes sociais e muito influente na sociedade civil. Os fatos negativos protagonizados pelo governo não ficarão para trás, simplesmente. As tentativas de aumentar impostos e a fraude do INSS, por exemplo, serão relembradas na campanha eleitoral.

O governo está numa sinuca. É difícil fazer um corte de gastos em áreas sensíveis, como emendas parlamentares, previdência ou subsídios. O aumento "disfarçado" de arrecadação, como a revisão de benefícios fiscais, taxação de fundos exclusivos ou offshores, com menor impacto direto no cotidiano da classe média, também não é fácil. Lula criou essa armadilha ao adotar uma estratégia de expansão da economia pelo aumento da arrecadação e do consumo. 

 

Por Opinião
postado em 31/05/2025 06:00 / atualizado em 31/05/2025 10:03
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